O transporte coletivo de Foz do Iguaçu, uma reflexão por Licério Santos

Uma reflexão sobre o transporte coletivo de Foz do Iguaçu por Licério Santos
Uma reflexão sobre o transporte coletivo de Foz do Iguaçu por Licério Santos

“A cidade avançada não é aquela em que os pobres andam de carro, mas aquela em que os ricos usam transporte público”.

A frase do urbanista ex-prefeito de Bogotá, Enrico Peñasola, que implantou os BRTs (bus rapid transit) na capital do Colômbia, pode resumir o conceito da nova vida urbana nas cidades.

Já chegamos ao senso comum, depois de muitos estudos, que o transporte coletivo é uma das melhores soluções, não a única, para a mobilidade urbana, ou seja, para o deslocamento das pessoas da casa ao trabalho principalmente, e para os afazeres do cotidiano.

O desafio, cada vez mais premente, é buscar a equação entre o custo operacional de um sistema, sem onerar investimentos em áreas prioritárias como a saúde e a educação, e oferecer um transporte de qualidade, ágil e eficiente. É justamente esse desafio que enfrentamos em Foz do Iguaçu e não de hoje, vem desde o final dos anos de 1970.

Mesmo antes da pandemia, enfrentávamos gargalos, superlotação, deficiências de concessões mal feitas e de certa fadiga nos sistemas implantados pelo mundo inteiro. Após a covid e com a guerra da Ucrânia e a Rússia, esse quadro se tornou mais agudo com a inflação e com escalada dolarizada de aumentos do óleo diesel.

O que já não era bom se tornou mais complicado ainda. Mesmo Curitiba, referência internacional do transporte público – inclusive serviu de modelo para Bogotá -, apresenta atualmente uma situação preocupante e o modal da capital paranaense se mantém com a tarifa de R$ 5,50 e subsídios em torno de R$ 130 milhões anuais.

Pode-se dizer que não há como comparar Curitiba e Foz do Iguaçu. Mas numa rápida pesquisa, se constata que a maioria das grandes e médias cidades tiveram que lançar mão de reajuste de tarifas e de subsídios: Ponta Grossa (R$ 5,50 em novembro de 2021) e Cascavel (R$ 4,50 em maio). Londrina e Maringá até reduziram o valor da tarifa, mas aumentaram os subsídios. Em Londrina, para uma redução de R$ 0,25 no valor da passagem, a prefeitura concedeu R$ 25,2 milhões em subsídios.

Em Foz não foi diferente. O valor do diesel aumentou 113,81% desde novembro de 2020. Desde março, quando a prefeitura assinou o contrato emergencial na operação do transporte coletivo, o diesel aumentou 48,09%. Somente em 2022, até o último dia 18 de junho, o aumento deste combustível – o principal insumo no cálculo das tarifas – somou  56,09%, enquanto a tarifa foi reajustada nesta segunda-feira (4) em 9,75% (R$ 4,50 no cartão e R$ 2,25 para estudantes).

Buscamos uma tarifa justa para evitar, neste momento, o colapso do sistema. O transporte urbano de Foz tem mais de 45 anos e o fluxo de pessoas nas áreas adensadas mudou muito. A primeira intervenção foi em 1985 e as ligações mais importantes eram entre as regiões do São Francisco, o canteiro de obras da Itaipu Binacional e o centro da cidade. A partir de 1990, o fluxo maior pendeu para as regiões do Porto Meira e Ponte da Amizade.

Ainda nos anos de 1990, foi implantado o Transcol, em 2010, uma nova concessão foi feita e em 2020, uma nova intervenção. Todas as intervenções no sistema procuraram um bom serviço à população, mas de resultados pífios, o que refletiu – isso no mundo inteiro – numa queda sensível no número de usuários.

Chegamos a 2022, uma nova realidade. A procura pelo transporte coletivo aumentou devido ao preço da gasolina. Aumentou também a procura de ciclovias e o incentivo de governos municipais e estaduais para utilização desse modal (ampliação da malha cicloviária, bicicletários e aluguel de bicicletas), as plantas das montadoras já começam a mudar para a produção de veículos elétricos, cada vez menores.

Grandes cidades no mundo, como Londres, têm restrições à circulação de carros em áreas adensadas; outras, como a própria Curitiba, têm as vias calmas (com a redução sensível de velocidade), além das canaletas exclusivas para ônibus. Há cidades que estimulam a circulação a pé com a criação de espaços, calçadões e quarteirões fechados. E ainda os horários diferenciados de trabalho (por exemplo entre 7h, 8h, 9h e 10h para as entradas e 17h, 18h, 19h e 20h para as saídas) e o uso de caronas, aplicativos e táxis compartilhados.

Todas essas propostas não eliminam e até incentivam mais ainda o uso do transporte urbano e também encaminham novas soluções. Como o subsídio federal para segmentos (idosos, jovens e estudantes – vale lembrar que em Foz, o estudante vai pagar R$ 2,25 na tarifa). Um exemplo, está em trâmite na Câmara de Deputados que deve votar um subsídio de R$ 5 bilhões aos idosos que usam o transporte coletivo em todo país. Em Foz, isso representa cerca de 30% dos usuários, uma vez que a cidade já adota a gratuidade para o idoso a partir dos 60 anos, não a partir dos 65 anos.

Há 27 cidades em todo país que praticam a tarifa zero, mas seus sistemas de transporte são pequenos e pouco impactam nos orçamentos das prefeituras. E a proposta da tarifa zero que seria bancada pela Cide (contribuição de intervenção no domínio econômico incidentes sobre o comércio de combustíveis) que arrecada R$ 72 bilhões por ano e que pode incluir, segundo o Instituto Brasil Transportes, mais 37 milhões de usuários, além dos 39 milhões de brasileiros que usam o ônibus.

Todas essas propostas, questões e soluções estão na mesa do debate para a licitação da concessão do novo sistema do transporte coletivo de Foz do Iguaçu. Além de uma tarifa que não penaliza o usuário, vamos assegurar um transporte coletivo de qualidade que se torne, realmente, o principal modal da cidade e cumprindo com a premissa de uma Foz ambientalmente sustentável e socialmente justa.

Licério Santos é diretor-superintendente do Foztrans (Instituto de Trânsito de Foz do Iguaçu).