Jovens continuam indo a festas, apesar da pandemia

As notícias são inúmeras e se repetem todos os dias: os flagrantes de festas clandestinas onde jovens se aglomeram diariamente. Em um mês, 716 festas clandestinas foram encerradas em SP, mostrou a reportagem da Agência Brasil

No Instagram, os flagrantes são mostrados em fotos e vídeos: o Brasil Fede Covid, perfil do Instagram que denuncia festas e aglomerações em todo o país, expõe também flyers de eventos, não para convidar, mas para alertar do que está acontecendo, sempre marcando na publicação as autoridades. 

Mas, embora bem informados da situação do país, o que leva adolescentes e jovens a esse comportamento de risco tem várias explicações, apontam os especialistas ouvidos pela Agência Brasil

A psiquiatra Danielle Herszenhorn Admoni, psiquiatra da infância e adolescência na Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo, explica que os adolescentes e os jovens adultos têm uma necessidade quase física de estar com os pares, com os grupos, pois eles deixam de se identificar com os pais para se identificar com os amigos. 

“Ter ficado longe das amizades e casos [românticos] foi muito marcante para os adolescentes e jovens, pois é um grupo que precisa mais estar fisicamente com os outros do que, por exemplo, as crianças e os adultos, que já conseguem ficar em casa, com a família. Outra questão é que o jovem tem a ideação de que vai dar tudo certo, por exemplo: ‘não preciso estudar muito, mas vou passar no vestibular”, ou seja, ele pensa: ‘posso ir numa balada que eu não vou pegar covid, estou acima de tudo isso’. Ele sabe dos riscos, mas fica uma ideação mágica. Ainda tem a questão do prazer imediato: ‘preciso me divertir, preciso estar com os amigos, não quero saber se vou adoecer, se vou ser preso’, enfim, depois ele vai ver o que acontece”, diz a especialista em psiquiatria pela Associação Brasileira de Psiquiatria. 

Na opinião da psicóloga Flávia Teixeira, mestre em Saúde Coletiva pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, outro fator contribuiu para este comportamento. “O fato de os jovens terem dados de que não fazem, ou não faziam, parte do grupo de risco, associado ao fato de que, podem ir à escola, frequentar praias, academias e clubes, de alguma forma, os leva a pensar que as baladas também podem ser frequentadas. Uma associação do tipo: “Se posso estar com meus amigos para estudar e praticar esportes, por que não estar com eles para me divertir?”, destaca a especialista, que também é professora de pós-graduação em Psicologia Hospitalar na Universidade Federal do Rio de Janeiro e pós-graduada em Psicossomática Contemporânea.

À medida que as regras de restrições foram ficando mais flexíveis e as possibilidades de sair se tornou mais concreta, os grupos foram se organizando e de alguma maneira estes jovens voltaram ao convívio, destaca Adriane Branco, psicóloga especialista em Saúde Integral do Adolescente pelo Sistema Único de Saúde (SUS). “Outro ponto que foi possível observar também é que independentemente de ter baladas, muitos ainda se reuniam em grupos menores, com pequenos eventos sociais, nas suas próprias casas, com o consentimento dos pais e/ou responsáveis, o que também dá uma falsa impressão de que “está tudo bem”, observou a especialista, que também é pesquisadora do Centro de Estudos e Pesquisas em Comportamento e Sexualidade. 

Foi o que aconteceu com a assessora de imprensa Carolina Caprioli, de 27 anos. Ela contou que começou a sair quando a cidade de São Paulo entrou para a Fase Laranja, quando os bares e locais de lazer começaram a abrir com as medidas de segurança. “Durante muitos meses fiquei isolada em casa apenas com os familiares. Nos aproximamos e também tivemos muitos desentendimentos. Eu sentia a necessidade de ver outras pessoas fora do meu círculo familiar para conversar sobre diversos assuntos, dar risada e também rever os amigos que há tantos meses não via”. 

Carolina tem um grupo de quatro amigas. “Estamos sempre juntas, entre nós. Em algumas reuniões estamos todas juntas e em outras só parte do grupo. Minhas amigas moram sozinhas, sem os pais, e nos reunimos na casa delas para bater papo, beber e fazer algumas atividades juntas”, conta a moradora da zona leste da capital paulista. 

Ela conta que recebeu convites para ir em festas clandestinas. “Geralmente os convites chegam por meio de amigos bem próximos, sem muita informação e nem divulgação. Os locais também são sempre revelados em cima da hora. Mas não fui em nenhuma festa.

Eu e minhas amigas não nos sentimos confortáveis em ir às festas porque a pandemia ainda está no auge e os números de mortes não param de baixar. Por mais que algumas delas estejam morando sozinhas, nós preferimos respeitar o momento e ficar em casa”.

Mesmo assim, depois dos encontros com as amigas, ela sentiu medo de ter sido infectada. “No Ano Novo, nós alugamos uma casa na praia e tivemos contato com outras pessoas também, além do nosso grupo de amigas. Logo depois, fiquei com muito receio de estar infectada e também tive muitos sintomas parecidos com a covid, mas que eram da minha cabeça porque todas às vezes testei e deu negativo. O psicológico fica sempre muito abalado”, desabafa a jovem.

Carolina conta ainda que está trabalhando em casa, mas que, quando sai e encontra com os amigos e depois volta, procura ficar de máscara mesmo dentro de casa, ainda que não divida o lar com idosos ou pessoas do grupo de risco. “Tomo os cuidados como: não me aproximar muito deles, evitar contato físico, fico isolada em um canto da casa”. 

Para ela, os jovens estão mais relaxados com os cuidados no geral. “A pandemia acabou durando muito mais do que o esperado e os jovens sentem-se limitados dentro de casa, já que costumavam sair para festas, baladas, bares e encontros.” 

Baladas x pancadões

Para as especialistas, o comportamento dos jovens é igual, tanto na periferia quanto no bairros nobres. “Acredito que aconteça e no mesmo nível. A diferença é que os bailes funks da periferia não possuem os muros dos bairros mais ricos. Os dois extremos querem se sentir diferentes do todo. Precisam provar que são poderosos. Que não são um gado que segue regras. E acredito ainda mais, que ambos os lados estão se vingando dos padrões impostos pela sociedade. Porque uns se sentem sufocados e outros se sentem injustiçados”, diz a educadora parental Stella Azulay, diretora da Escola de Pais XD.  

Opinião semelhante tem a psicóloga Adriane Branco. “Para o jovem de periferia, muitas vezes ficar em casa, em um espaço pequeno, também é desconfortável fisicamente, e o excesso de convivência é outro fator que os leva para a rua em busca de diversão. Jovens que estão em bairros mais ricos, na maioria dos casos não têm o problema do pouco espaço, porém também não estão acostumados com a convivência constante com os pais e familiares imposta pelo isolamento social. E ambos, independente de onde estejam, tem comportamentos típicos do jovem, que é a necessidade voraz de viver, de estar em grupo, de diversão”.

A educadora parental acrescenta que no caso de uma pandemia, existe o agravante de estarem colocando em risco centenas de outras pessoas. “E essa falta de visão da realidade, de empatia, é que deve preocupar e mobilizar cada um de nós para uma reflexão sobre quem serão os adultos de amanhã”, reflete Stella. 

Conscientização 

Um dos caminhos para reverter esse quadro de aglomerações em festas é a conscientização direcionada aos jovens, aponta a Danielle H. Admoni, psiquiatra da infância e adolescência. “É interessante pensar em campanhas que falem a linguagem do adolescentes e do adulto jovem. Temos exemplos de outros países que têm feito isso. São exemplos mais concretos que mostram não somente o prejuízo para eles, mas porque saem espalhando covid para outras pessoas com comorbidades, acho que é mostrar isso, que o prazer imediato pode trazer uma consequência gravíssima depois”. 

O governo paulista divulgou, nas emissoras de TV e redes sociais, vídeo para sensibilizar os jovens. O vídeo foi criado pelo governo do Mato Grosso do Sul e cedido ao governo paulista.  

A psicóloga Flávia Teixeira diz acreditar que nesse momento, os pais e responsáveis devem ser mais enfáticos. “Mais do que nunca, é preciso que estejamos à frente das decisões sobre o ir e vir deles. Nós devemos dar os limites e as regras desse jogo, ainda muito desconhecido, inclusive para nós. Adolescentes e jovens precisam de direcionamento, de contorno, e de segurança. Nós adultos somos responsáveis por eles, e devemos ser os agentes de segurança nesse momento de tamanha incerteza e fragilidade. A diversão e a interação são, sem dúvida nenhuma, muito importantes para nos mantermos saudáveis, mas para isso, precisamos priorizar e preservar a vida. Devemos compreender que em alguns momentos abrir mão, e perder algumas coisas, são fundamentais para muitos outros ganhos futuros”, destaca.

Orientação parental 

A educadora parental Stella Azulay diz acreditar que, apesar de terem mais acesso a informação do que antigamente, os adolescentes e jovens de hoje são muito mais imaturos. “E isso já começa em casa, na educação que recebem dos pais. Com muita dificuldade em educarem seus filhos com limites e valores, os pais vão deixando passar diversos comportamentos inadequados, seja por fraqueza, preguiça, cansaço ou até mesmo falta de preparo para lidar com os desafios da educação”.

Segundo a educadora, os jovens encontram nas baladas uma forma de manifestar suas carências e suas rebeldias. “Quanto mais se sentem abandonados pelos pais, mais se comportam dessa forma, como se fosse uma vingança, ou tipo, um grito de socorro para sociedade. Não estou querendo jogar toda responsabilidade das ações desses jovens nos pais, porém estamos sim assistindo a consequências de uma falta de preparo dos adultos que devem ser mentores e grandes influenciadores de seus filhos”.

Mas, mesmo diante das dificuldades, são os pais que podem ajudar a mudar esse comportamento de risco, aponta a educadora. “Acredito muito que a casa seja o eixo de equilíbrio. Na minha opinião, a cura começa pela fala, pelo diálogo. Começa no momento em que os pais vão abrir o jogo, abrir seus corações, verbalizar a seus filhos como se sentem, o que estão passando. Compartilhar as angústias une as famílias, envolve os filhos no problema, eles passam então a fazer parte da solução”. 

Ela chama atenção para que os pais criem vínculos com seus filhos. “Pais, escutem seus filhos, busquem momentos de paz para criar oportunidades de troca, tenham paciência, façam um esforço a mais na direção certa. Aproveitem a chance para criarem vínculos verdadeiros com seus filhos. Ofereçam a eles ferramentas para que façam boas decisões. A mudança de postura começa de cima para baixo”, aconselha a educadora.

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via redação Busão Curitiba

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Reino Unido anuncia mais R$ 215 milhões para o Fundo Amazônia

O Reino Unido anunciou hoje (2) a doação de 35 milhões de libras (cerca de R$ 215 milhões) adicionais para o Fundo Amazônia. O anúncio foi feito pela ministra de Segurança Energética do Reino Unido, Claire Coutinho, em meio à Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas de 2023 (COP28), em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos.  

Em maio, o primeiro-ministro do Reino Unido, Rishi Sunak, já havia anunciado o aporte de 80 milhões de libras (cerca de R$ 500 milhões) no Fundo Amazônia. O contrato para a transferência desse primeiro montante foi assinado neste sábado (2), durante a COP23.  

O contrato foi assinado com o presidente do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Aloizio Mercadante. O banco público de fomento é o responsável pela gestão do Fundo Amazônia. A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, também estava presente.  

Criado em 2008, o Fundo Amazônia, considerado a principal iniciativa internacional para redução das emissões de gases do aquecimento global e de preservação da floresta. São doadores do fundo países como Noruega, Alemanha, EUA, Suíça e, agora, Reino Unido.   

Desde que foi instituído, o Fundo Amazônia recebeu R$ 3,4 bilhões e financiou mais de 102 projetos de preservação da floresta e promoção de atividades sustentáveis na Amazônia, em um investimento total de R$ 1,75 bilhão. 

Retomada 

Em 2019, durante o governo de Jair Bolsonaro, o então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, extinguiu os dois comitês responsáveis pela gestão dos recursos do Fundo Amazônia, inviabilizando o financiamento de projetos e a continuidade das doações.  

A existência desses comitês é uma condição contratual dos doadores, para impedir que o dinheiro seja utilizado para outros fins. Segundo dados do BNDES, o Brasil deixou de investir cerca de R$ 3 bilhões em ações ambientais entre 2019 de 2022, valor que permaneceu retido no fundo após a dissolução dos comitês orientadores. 

Em outubro de 2022, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que a União tomasse as providências necessárias para reativar o Fundo Amazônia. Na ocasião, a maioria dos ministros concluiu pela inconstitucionalidade da extinção dos comitês, pois configuraria omissão do governo em seu dever de preservar a Amazônia.  

Reinstituídos por decreto em 1º de janeiro de 2023 pelo presidente Lula, os comitês retomaram suas atividades, o que permitiu os novos aportes de recursos. 

via redação Busão Curitiba

Lula pede que países ricos paguem conta por preservação de florestas

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou, neste sábado (2), que são os países ricos que devem pagar a conta pela preservação das florestas. Ao discursar em reunião na Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas de 2023 (COP28), em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, Lula destacou que essa é a primeira vez, em 28 anos de COPs, que as “florestas falam por si”.  

“É a primeira vez que as florestas vêm falar por si. É a primeira vez que nós estamos dizendo: não basta evitar desmatamento, é preciso cuidar da floresta, cuidar das pessoas que moram na floresta, e cuidar da biodiversidade da floresta. Isso custa muito dinheiro, e os países ricos têm que ajudar a pagar essa conta. É isso que nós queremos nesta COP”, afirmou.  

O presidente participou, ao lado da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, de evento chamado Protegendo a Natureza para o Clima, Vidas e Subsistência, que reuniu especialistas, representantes de povos de florestas e chefes de Estado de países com florestas, como o presidente da França, Emannuel Macron, devido a posse sobre o território da Guiana Francesa, aqui na América do Sul.  

Lula cedeu seu tempo de fala para a ministra Marina uma vez que ela cresceu nos seringais da floresta amazônica, no Acre. O presidente chorou ao lembrar a história de vida da ministra.  

02.12.2023 - Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva e o Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante a reunião do G77+China sobre Mudança do Clima, na Expo City Dubai – Sala Plenária Al Ghafat. Dubai - Emirados Árabes Unidos. 

Foto: Ricardo Stuckert / PR
02.12.2023 - Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva e o Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante a reunião do G77+China sobre Mudança do Clima, na Expo City Dubai – Sala Plenária Al Ghafat. Dubai - Emirados Árabes Unidos. 

Foto: Ricardo Stuckert / PR
Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva e o Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante reunião sobre Mudança do Clima, em Dubai. Foto: Ricardo Stuckert / PR

“Eu não poderia utilizar a palavra sobre a floresta, se tenho no meu governo uma pessoa da floresta. A Marina nasceu na floresta, se alfabetizou aos 16 anos. Eu acho que é justo que, para falar da floresta, ao invés de falar o presidente, que é de um Estado que não é da floresta, a gente tem é que ouvir ela, que é a responsável pelo sucesso da política de preservação ambiental que nós estamos fazendo no Brasil”, destacou. 

Em seu primeiro dia, na quinta-feira (30), a COP28 aprovou um fundo climático para financiar perdas e danos de países vulneráveis. O objetivo do novo fundo é ajudar as nações pobres a lidar com desastres climáticos.

Polícias ambientais do Brasil

A ministra Marina Silva fez um breve relato das políticas do governo federal para preservação da floresta, destacando as ações de combate ao desmatamento ilegal da Amazônia que, de acordo com Marina, foram responsáveis por reduzir a derrubada da floresta em 49,5% nos 10 primeiros meses de governo, “evitando lançar na atmosfera 250 milhões de toneladas de CO₂. Se não fossem suas medidas, teríamos um aumento do desmatamento de 54%”.  

Marina também destacou as políticas para os povos indígenas e quilombolas como essenciais para preservação das florestas. “Os povos originários são responsáveis por 80% das florestas protegidas do mundo, e o povo quilombola agora também tem uma mulher, uma mulher negra, Anielle Franco, uma jovem que está ajudando a proteger floresta com o povo quilombola”, ressaltou. 

Ainda segundo a ministra do Meio Ambiente, a política do governo não é setorial, mas está em todos os ministérios e citou, como exemplo dessa abordagem sistêmica, o Plano de Transformação Ecológica apresentado pelo Ministério da Fazenda.

Referindo-se ao presidente Lula, a ministra afirmou que “sua diretriz para proteger a floresta é mais do que comando e controle [fiscalização e repressão], é uma diretriz de desenvolvimento sustentável em suas quatro dimensões: na dimensão ambiental, na dimensão social, na dimensão econômica e na dimensão cultural.” 

Nesta COP, o Brasil apresentou proposta para que os países com Fundos Soberanos invistam, ao menos, US$ 250 bilhões em um Fundo para manutenção das florestais tropicais de todo o mundo.  

via redação Busão Curitiba