coletivo destaca trajetórias de servidoras pretas

Mulheres pretas que tiveram carreira de destaque no serviço público são o foco de um perfil de rede social que busca combater a invisibilidade dessas personalidades e servir de inspiração para outras negras. A iniciativa é do Coletivo de Mulheres Negras Servidoras e Empregadas Públicas do Governo Federal, que criou a página @servidorasnegras no Instagram.  

Em cada uma das cinco semanas deste mês da Consciência Negra, o coletivo publica uma minibiografia das servidoras que abriram caminhos no serviço público. 

A primeira a ser homenageada pela página reúne ainda o elemento curiosidade. Uma mulher que ficou conhecida como Primeira-Dama do Samba, mas que marcou o nome também na reforma psiquiátrica no Brasil. Yvonne Lara da Costa era servidora do Ministério da Saúde e, no mundo da música, ficou conhecida como Dona Ivone Lara.

Não bastasse a relevância que teve no ambiente do samba, Dona Ivone teve uma carreira de destaque como servidora pública voltada para a saúde mental. Foram 37 anos de atuação. Formada em enfermagem e assistência social, a cantora e compositora teve papel de vanguarda ao levar para pacientes o mesmo que oferecia aos admiradores de sua produção artística, a música. 

Yvonne Lara da Costa era especializada em terapia ocupacional. O interesse de usar a música nos tratamentos levou à união com outro grande nome do cuidado psiquiátrico no país, Nise da Silveira. As duas trabalham juntas no Rio de Janeiro. 

Nise revolucionou o tratamento psiquiátrico no país com ações humanizadas, em contraste aos procedimentos agressivos como eletrochoques e lobotomia. Yvonne sugeriu a Nise que criasse uma sala com instrumentos musicais dentro do hospital em que trabalhavam, isso na década de 40.

“O trabalho de Dona Ivone Lara como servidora foi fundamental para a reforma psiquiátrica no Brasil”, afirma o perfil, que traz uma foto da então enfermeira no hospital em que trabalhava. Dona Ivone morreu em 2018, aos 96 ano.

Surgimento

O coletivo de servidoras negras tem cerca de 170 participantes. O grupo foi criado no começo do ano, depois de uma declaração da ministra do Planejamento, Simone Tebet, sobre dificuldade de conseguir mulheres pretas para compor a equipe. 

“Quero não só ter mulheres, mas mulheres pretas. E a gente sabe, lamentavelmente, que mulheres pretas normalmente são arrimo de família. Trazer de fora de Brasília é muito difícil”, disse Tebet, um dia antes de tomar posse em 4 de janeiro.  

“Algumas mulheres negras se sentiram particularmente atingidas por essa fala, que não condiz com a realidade. A gente tem um grupo significativo de mulheres com qualificações até mais altas que a de algumas pessoas que estão em determinados cargos do governo. Então, essas mulheres começaram a se organizar”, explicou à Agência Brasil Barbara Rosa, uma das organizadoras do coletivo. 

Barbara é servidora do Ministério da Educação (MEC) e está cedida ao Ministério das Relações Exteriores (MRE), onde atua como coordenadora de planejamento de contratações.

À época da posse, a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, se comprometeu a ajudar Tebet com uma lista de currículos de mulheres pretas. No dia da posse, Tebet comentou sobre a ajuda. “Foi bom que agora está vindo um monte de currículo. Estou achando ótimo”. 

Diplomata 

O Itamaraty foi a casa de outra homenageada pelo perfil @servidorasnegras. Trata-se de Mônica de Menezes Campos. Em 1978, aos 22 anos, Mônica foi a primeira mulher preta a ingressar no Instituto Rio Branco, órgão do governo para formação de diplomatas. Em 1980, se tornou a primeira negra diplomata. 

“Sua admissão à carreira diplomática foi um marco. A trajetória de Mônica de Menezes Campos é um referencial para mulheres negras do serviço exterior brasileiro e para candidatas às carreiras de diplomata e de oficial de chancelaria”, publicou o coletivo no Instagram. Mônica morreu em 1985, aos 27 anos, vítima de um aneurisma cerebral. 

No último dia 9 de novembro, o Itamaraty realizou o seminário Relações Internacionais, Política Externa e Igualdade Racial: Reflexões em Homenagem a Mônica de Menezes Campos. O encontro abordou o programa de ação afirmativa do MRE, igualdade racial como objetivo transversal da política externa, impacto de acadêmicas negras na teoria das relações internacionais e igualdade racial no serviço exterior.  

Primeira engenheira negra 

Outra servidora lembrada é Enedina Alves Marques, a primeira engenheira negra do Brasil. Filha de um lavrador e de uma empregada doméstica, a curitibana se formou em engenharia civil em 1945, pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Precisou trabalhar como doméstica para ajudar a pagar os estudos. Foi a primeira mulher a atingir a formação em engenharia no estado. 

“Ao longo da graduação, Enedina teve embates com colegas, professores e com a própria instituição de ensino, por ser mulher, negra e pobre em um curso reservado aos homens brancos e ricos”, diz a publicação no Instagram. 

Funcionária do Departamento Estadual de Águas e Energia Elétrica do Paraná, Enedina foi uma das responsáveis pela construção da Usina Capivari-Cachoeira (atual Parigot de Souza), inaugurada em 1971 no município de Antonina, litoral do Paraná. 

“Enedina abriu espaços para a presença de pessoas negras e de mulheres na engenharia, sendo ainda hoje inspiração para mulheres negras que buscam espaço nas áreas de ciência e tecnologia”, escreveu o coletivo.

Em janeiro deste ano, quando completou 110 anos de nascimento, a engenheira preta recebeu uma homenagem na página de busca principal do Google. 

A biografia de Enedina, que em 1940 buscou inserir-se em uma área profissional ocupada majoritariamente por homens, foi tema do trabalho de conclusão do curso de história na UFPR.

Enedina morreu em 20 de agosto de 1981, aos 61 anos. 

Pioneira na medicina 

A baiana Maria Odília Teixeira é mais uma das homenageadas pelo perfil. Filha de um médico branco de origem pobre e neta – por parte de mãe – de uma ex-escravizada, Maria Odília se tornou a primeira negra formada em medicina no país, em 1909.

Ainda na graduação, trabalhou para desmistificar teorias embasadas no racismo científico. Apresentou tese sobre a cirrose, desvinculando-a da população preta. 

“A médica optou por não discutir os aspectos sociais da doença, nem atribuiu fatores genéticos e raciais às pessoas que desenvolviam a cirrose alcoólica. Diferentemente de muitos contemporâneos, Odília não recorreu a nenhum pressuposto das teorias racialistas”, escreveu em dissertação acadêmica Mayara Santos, mestre em história social pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). 

Em 1914, Maria Odília atingiu mais um pioneirismo ao ser a primeira professora negra da Faculdade de Medicina da Bahia, onde se formou. A primeira médica negra do Brasil morreu em 1970, aos 86 anos.  

Música e ativismo

Aos 85 anos, uma homenageada que une ativismo pelo movimento negro e pioneirismo na educação é Lydia Garcia, primeira professora de música da rede pública do Distrito Federal. A carioca, formada em piano clássico, é filha de uma costureira e de um funcionário público. Ela foi para a capital federal na década de 60, onde vive atualmente.

Lydia se utilizava de atividades como ciranda, coral, cantigas, entre outras, para iniciar crianças no mundo musical. Além do ensino de alunos, atuou também na formação de professores.  

Ela criou, há mais de 30 anos, o Bazafro, ateliê cultural de moda e arte étnica que valoriza a autoestima e historicidade do povo negro. Além disso, é matriarca do Coletivo de Mulheres Negras Baobá. 

A pianista, professora e ativista é vencedora do 1º Prêmio Cultura Afro-Brasileira, promovido pela Secretaria de Cultura do Distrito Federal, e do 3º Prêmio Marielle de Direitos Humanos, oferecido pela Câmara Legislativa do Distrito Federal. 

Inspiração

A servidora do MEC Barbara Rosa contou que os nomes foram escolhidos em reuniões do coletivo, e a divulgação dos perfis tem dois objetivos principais. 

“O primeiro é proporcionar reflexão sobre a carreira, sobre as possibilidades que a gente tem. O segundo é reconhecer e valorizar o legado dessas mulheres, seja em vida ou pós-morte. Trazer à luz essas trajetórias.” 

Além de combater o que classifica como invisibilidade de servidoras públicas pretas, o coletivo acredita que a iniciativa é um incentivo para que mais negras queiram fazer carreira no setor.  

“Nosso perfil atinge não só mulheres que já são servidoras. Queremos inspirar nessas trajetórias históricas e consolidadas, porém não tão visíveis, outras mulheres que almejam destaque no serviço público”.

Representatividade 

Reportagem publicada pela Agência Brasil no mês passado mostrou que pessoas negras, apesar de figurarem como maioria da população brasileira (56%), são apenas 35% no serviço público federal, além de receber menores salários. 

O coletivo de mulheres negras reconhece a baixa representatividade. Esse é um dos motivos para a realização de seminários preparatórios para concursos públicos. De agosto a outubro, 250 pessoas participaram dos encontros.  

Barbara acredita que a valorização de mulheres negras no setor público se dá por meio de mais presença e igualdade.  

“Essa valorização se dá tanto por valorizar as carreiras onde estamos, na redução das desigualdades salarias entre carreiras, na garantia de oportunidades de ascensão e exercício de liderança, e na ampliação da participação nas carreiras onde somos minoria”, disse. 

“Para fazer isso é necessário reformular a forma de ingresso a fim de garantir diversidade e, ao mesmo tempo, propiciar que pessoas que já são servidoras tenham oportunidades de terem carreiras que garantam qualidade de vida e dignidade”, conclui. 

Lei de Cotas 

A disparidade entre negros e brancos poderia ser pior não fosse a Lei de Cotas (Lei 12.990, de 9 de junho de 2014), que reserva 20% das vagas em concursos públicos da União para pretos e pardos. No ano 2000, para cada 100 novos servidores do Executivo federal, 17 eram negros. Em 2020, essa relação saltou para 43 em 100 novos aprovados. 

A lei tem vigência de dez anos a contar de 2014, mas há iniciativas para que seja prorrogada. Uma delas é o Projeto de Lei 1.958, de 2021, de autoria do senador Paulo Paim (PT/RS), que tramita no Senado e mantém a reserva de 20% por mais dez anos.

Dentro do governo, além de interesse na prorrogação da lei, há um movimento para aumentar a faixa de reserva de 20% para 30%. A proposta foi construída pelos ministérios da Igualdade Racial, da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos e da Justiça e Segurança Pública. 

Comissionados

Outra medida para diminuir a desigualdade dentro do serviço público é o decreto assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em março deste ano, que reserva 30% dos cargos de confiança na administração direta, autarquias e fundações para pessoas negras. 

As cotas são para os cargos comissionados executivos (CCE), de livre nomeação, e as funções comissionadas executivas (FCE), também de livre nomeação, mas exclusivas para servidores concursados. A norma determina a observação da paridade de gênero na ocupação desses cargos. 

via redação Busão Curitiba

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Lula pede que países ricos paguem conta por preservação de florestas

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou, neste sábado (2), que são os países ricos que devem pagar a conta pela preservação das florestas. Ao discursar em reunião na Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas de 2023 (COP28), em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, Lula destacou que essa é a primeira vez, em 28 anos de COPs, que as “florestas falam por si”.  

“É a primeira vez que as florestas vêm falar por si. É a primeira vez que nós estamos dizendo: não basta evitar desmatamento, é preciso cuidar da floresta, cuidar das pessoas que moram na floresta, e cuidar da biodiversidade da floresta. Isso custa muito dinheiro, e os países ricos têm que ajudar a pagar essa conta. É isso que nós queremos nesta COP”, afirmou.  

O presidente participou, ao lado da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, de evento chamado Protegendo a Natureza para o Clima, Vidas e Subsistência, que reuniu especialistas, representantes de povos de florestas e chefes de Estado de países com florestas, como o presidente da França, Emannuel Macron, devido a posse sobre o território da Guiana Francesa, aqui na América do Sul.  

Lula cedeu seu tempo de fala para a ministra Marina uma vez que ela cresceu nos seringais da floresta amazônica, no Acre. O presidente chorou ao lembrar a história de vida da ministra.  

02.12.2023 - Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva e o Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante a reunião do G77+China sobre Mudança do Clima, na Expo City Dubai – Sala Plenária Al Ghafat. Dubai - Emirados Árabes Unidos. 

Foto: Ricardo Stuckert / PR
02.12.2023 - Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva e o Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante a reunião do G77+China sobre Mudança do Clima, na Expo City Dubai – Sala Plenária Al Ghafat. Dubai - Emirados Árabes Unidos. 

Foto: Ricardo Stuckert / PR
Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva e o Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante reunião sobre Mudança do Clima, em Dubai. Foto: Ricardo Stuckert / PR

“Eu não poderia utilizar a palavra sobre a floresta, se tenho no meu governo uma pessoa da floresta. A Marina nasceu na floresta, se alfabetizou aos 16 anos. Eu acho que é justo que, para falar da floresta, ao invés de falar o presidente, que é de um Estado que não é da floresta, a gente tem é que ouvir ela, que é a responsável pelo sucesso da política de preservação ambiental que nós estamos fazendo no Brasil”, destacou. 

Em seu primeiro dia, na quinta-feira (30), a COP28 aprovou um fundo climático para financiar perdas e danos de países vulneráveis. O objetivo do novo fundo é ajudar as nações pobres a lidar com desastres climáticos.

Polícias ambientais do Brasil

A ministra Marina Silva fez um breve relato das políticas do governo federal para preservação da floresta, destacando as ações de combate ao desmatamento ilegal da Amazônia que, de acordo com Marina, foram responsáveis por reduzir a derrubada da floresta em 49,5% nos 10 primeiros meses de governo, “evitando lançar na atmosfera 250 milhões de toneladas de CO₂. Se não fossem suas medidas, teríamos um aumento do desmatamento de 54%”.  

Marina também destacou as políticas para os povos indígenas e quilombolas como essenciais para preservação das florestas. “Os povos originários são responsáveis por 80% das florestas protegidas do mundo, e o povo quilombola agora também tem uma mulher, uma mulher negra, Anielle Franco, uma jovem que está ajudando a proteger floresta com o povo quilombola”, ressaltou. 

Ainda segundo a ministra do Meio Ambiente, a política do governo não é setorial, mas está em todos os ministérios e citou, como exemplo dessa abordagem sistêmica, o Plano de Transformação Ecológica apresentado pelo Ministério da Fazenda.

Referindo-se ao presidente Lula, a ministra afirmou que “sua diretriz para proteger a floresta é mais do que comando e controle [fiscalização e repressão], é uma diretriz de desenvolvimento sustentável em suas quatro dimensões: na dimensão ambiental, na dimensão social, na dimensão econômica e na dimensão cultural.” 

Nesta COP, o Brasil apresentou proposta para que os países com Fundos Soberanos invistam, ao menos, US$ 250 bilhões em um Fundo para manutenção das florestais tropicais de todo o mundo.  

via redação Busão Curitiba

Maceió registra abalo sísmico na região ameaçada de desabamento

A Defesa Civil de Maceió informou que nesta sexta-feira (1) foi registrado um evento sísmico de magnitude de 0,39Ml a 330m de profundidade na região do Mutange, onde está localizada a mina número 18 de exploração de sal-gema pela Braskem.

O órgão informou que mantém alerta máximo e constante observação devido ao risco de iminente colapso da mina 18, na região do antigo campo de treinamento do clube de futebol CSA, no Mutange. Três sensores no local continuam apresentando alertas de movimentação.

Nas últimas 24 horas, foi registrado 11,4 cm de afundamento, com média de 1 cm por hora.

Braskem retira trabalhadores

Após recomendação do Ministério Público do Trabalho (MPT), a mineradora Braskem retirou seus empregados efetivos e terceirizados da área da mina 18.

O procurador do Trabalho Rodrigo Alencar condicionou a retomada dos trabalhos à avaliação técnica das autoridades competentes no sentido de garantir a segurança de todos os trabalhadores relacionados à empresa.

Fonte: Veja a matéria no site da Agência Brasil

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via redação Busão Curitiba