Livro reúne descrição e fotos de 367 espécies de girinos de anuros

Trabalho de coleta de dados e editoração levou 12 anos e tem participação de docente da UNILA; objetivo é que a obra seja um guia para estudos e pesquisas acadêmicas


publicado:
05/02/2025 08h00,


última modificação:
04/02/2025 15h30

Um grupo de pesquisadores concluiu, recentemente, o livro Girinos do Brasil. Organizado pela pesquisadora Denise Rossa-Feres (Unesp) e com a participação do docente da área de Biologia da UNILA Michel Varajão Garey, o livro traz fotos e descrição de 367 espécies de girinos de anuros (sapos, rãs e pererecas) dos seis biomas brasileiros. A intenção é que o livro, que tem mais de 800 páginas, seja um guia para estudos e pesquisas acadêmicas.

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“Não encontramos nenhum livro que reúna descrição de girinos dessa forma. Agora temos um compilado muito grande para ajudar na identificação das espécies de girinos”, diz Michel. Essa particularidade do livro é explicada em razão do baixo número de pesquisas sobre girinos. “A maior parte dos estudos são de animais adultos porque há mais facilidade para sua identificação”, explica o pesquisador, lembrando que o canto e o fato de poder serem vistos mais facilmente são os principais fatores para esse resultado. “Quando vê um girino dentro da água, todo mundo fala ‘nossa, é tudo igual’. E a nossa ideia é justamente mostrar que não é tudo igual e que é possível diferenciar a partir das características descritas no livro.”

Os pesquisadores mediram várias características do corpo dos girinos: diâmetro do olho, distância entre as narinas, distância do olho para as narinas, comprimento do corpo e da cauda, altura da nadadeira e da musculatura entre outras. “Essas medidas, que chamamos morfometria, podem ajudar a estimular pesquisadores a ir a campo coletar girinos e saber com quem está trabalhando, porque hoje temos poucas coleções científicas com um bom acervo de girinos”, comenta Michel. Além das medidas, o livro informa em qual ambiente vive o girino e as características visuais das espécies por meio de fotos que mostram a vista lateral, a vista dorsal e detalhes da boca.

A pesquisa com girinos também abre possibilidades de expansão dos temas em estudo. “Girino é um ótimo modelo de estudo porque ele está dentro da água e aí temos toda a questão de contaminação de corpo d’água, de aplicação de agrotóxico que a chuva carreia para dentro do corpo d’água, o microplástico. O girino está exposto a agentes estressores que impactam diretamente o ambiente onde ele vive, bem como o ecossistema terrestre ao redor.”

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Michel Varajão Garey, pesquisador: “estamos preenchendo lacunas”

Foram recolhidas amostras de girinos em mais de 500 corpos d’água, de poças a bromélias, localizados nos seis biomas brasileiros – Amazônia, Caatinga, Cerrado, Mata Atlântica, Pampa e Pantanal – e nas áreas de transição entre esses biomas. O Bioma da Mata Atlântica inclui girino coletado por Michel Garey no Parque Nacional do Iguaçu.

O projeto nasceu como parte do Sistema Nacional de Pesquisa em Biodiversidade do Brasil (Sisbiota), em 2012. Nessa época, o Brasil registrava mais de 1.144 espécies de sapos, rãs e pererecas, das quais, em torno de mil, possuem girinos livre nadantes (objeto do estudo). “Aproximadamente 38% dessas mais de mil espécies de anuros conhecidas não tinham girinos descritos formalmente em 2012. De lá para cá, muitas espécies foram descritas pela equipe do Projeto Sisbiota Girinos do Brasil, algumas das quais eu participei. Aproximadamente, um terço dos girinos não eram conhecidos e, dos dois terços restantes, um terço está contemplado no nosso livro”, diz Michel. “É uma lacuna no conhecimento que estamos preenchendo.”

O pesquisador aponta outra dificuldade em relação à descrição de girinos. “Muitos foram descritos nas décadas de 1950 e 1960, quando se descrevia com uma menor quantidade de informação. Como havia poucos girinos descritos, então os pesquisadores se preocupavam apenas em diferenciar do que já existia”, aponta. “Hoje, as descrições já são muito mais completas, com muito mais caracteres. Conforme foi aumentando o volume de informações, fomos precisando de mais dados para poder diferenciar bem. Então, características que antes não eram comuns nas descrições, hoje são”, explica citando como exemplo a presença de linha lateral nos girinos, sua distribuição e forma; e as estruturas presentes na boca.

Michel ressalta que a pesquisa gerou um volume muito grande de informação. “Não basta conseguir identificar, tem que medir. E não mede um, são vários de cada espécie e tem de estar no estágio ideal.” Ele explica que o girino passa por 45 estágios em sua metamorfose, desde a fecundação do ovo até se transformar em adulto. O tamanho médio dos girinos varia de 3 a 5 centímetros, mas alguns podem passar de 15 centímetros de comprimento. “É um livro básico para quem pesquisa ou quer pesquisar girinos.”

Chegar a esse resultado levou 12 anos de trabalho colaborativo, com a participação de outros 22 pesquisadores. Além do livro, a pesquisa também gerou diversos artigos e a coleção de livros infantis  livro “De girino a adulto: muita história para contar”. Para garantir um resultado uniforme, a equipe de pesquisadores participou de reuniões de alinhamento e treinamento para a tomada de medidas. “Tudo foi padronizado para que todos adotassem os mesmos critérios para haver o mínimo desvio possível”, salienta o pesquisador. “Foi um grande esforço da professora Denise de Cerqueira Rossa-Feres, uma das maiores especialistas em girinos no Brasil e que coordenou todo o trabalho.”

Dendropsophus giesleri , coletado em Ouro Branco-MG
Procaratophrys avelinoi, coletado Parque Nacional do Iguaçu
Synapturanus ajuricaba, coletado em Manaus (AM)
Legendas que identificam as características dos girinos